Sala de Aula
Motoboys: Filhos do asfalto nas artérias da exclusão
O livro traz um tópico contemporâneo sobre as relações de trabalho no mundo atual
A profissão de motoboy é um tema que propõe debates desde os anos 1990 e ainda hoje funciona como um tema bastante conectado com o que chamamos de atualidades. A sua função nas artérias que interligam os grandes e pequenos centros urbanos ao redor do Brasil permitem reflexões sobre educação para o trânsito, saúde pública, desigualdade social, bem como a uberização dos serviços, um tópico contemporâneo sobre as relações de trabalho no mundo atual, tangencial com os pontos debatidos pela ONU para a sua Agenda 2030, documento que tem como propósito, trazer melhorias como meta para o estabelecimento de ambientes de atuação mais justo para todos aqueles que exercem as suas profissões no cotidiano. Há mais questões para levantamento, sendo estas algumas das que consegui elencar agora, enquanto escrevo sobre Motoboys: Filhos do Asfalto nas Artérias da Exclusão, livro da pesquisadora Silvana de Andrade Barbaric, mestre em História e Gestora da Companhia de Tráfego de São Paulo, escritora que possui algumas publicações sobre o tema, sendo este material um de seus destaques, por sinal, leitura que empolga e faz o leitor torna-se um acompanhante voraz de sua jornada analítica que abrange um panorâmico cenário histórico, antes de chegar ao contemporâneo e delinear a atuação do motoboy, figura estereotipada pela sociedade, parte integrante dos meandros da desigualdade proporcionada pelo capitalismo.
Publicado em 2016, Motoboys: Filhos do Asfalto nas Artérias da Exclusão traz em sua estrutura física uma capa atraente e conectada com a temática das reflexões da autora, trabalho de Carolyn Dourado, parte integrante do projeto gráfico de Bruno Balota, responsáveis por distribuir os conteúdos complexos numa diagramação simples, mas organizada para o leitor que atravessa as 180 páginas de escrita fluente da autora, com pequenos erros de revisão na digitação, nada que atrapalhe a empreitada de aprendizagem ao virar de cada página, em especial, do primeiro e mais extenso capítulo, uma aula de História incrivelmente densa, mas empolgante. Silvana de Andrade cita Baudelaire, associa os seus temas com música e para nós, professores, mapeia uma série de referências para que possamos organizar aulas, palestras, debates e conteúdos para redes sociais que contemplem a temática da educação para o trânsito, o foco desta crítica ao livro, a motivação para adquiri-lo em pesquisas realizadas sobre a palavra-chave “trânsito”.
No desenvolvimento de Os Trabalhadores do Canto da Rua, capítulo de abertura, o texto filosofa sobre o conceito de rua, um espaço público de circulação múltipla. Relaciona com o poema Os Olhos dos Pobres, de Baudelaire, além de traçar uma análise minuciosa e dinâmica da maneira como o território brasileiro começou a elaborar os desenhos das grandes cidades, em especial, São Paulo, objeto do trabalho da pesquisadora. Ineficácia do transporte público, o mapeamento do que seria centro e do que se tornaria periferia, o surgimento do metrô e suas primeiras linhas, a transformação das relações econômicas e a presença dos motoboys como figuras essenciais para os avanços em diversas frentes destes relacionamentos que escancaram a desigualdade de nossa nação desde sempre. Mesmo funcionais e importantes para o atendimento das necessidades de grandes empresas, os profissionais em questão sempre estiveram longe da associação de sua função com o ideal de trabalho digno.
Em A Construção da Centralidade na Centralidade do Trabalho, o livro foca nos problemas da falta de regulamentação desta profissão e analisa a questão da formação de identidade destes jovens que se entregam aos riscos e pressões no epicentro e nas beiras da agitada mobilidade urbana paulista contemporânea. Comparações entre o uso de motocicleta e automóveis, a fabricação de motos e a publicidade em torno deste modal como representação da liberdade, bem como a informalidade como elemento basilar da profissão: eis os principais pontos deste ótimo capítulo, mais curto que o anterior, mas não menos interessante e embasado. A autora fornece dados estatísticos, trechos de depoimentos, mesclando com teorias econômicas para elucidar os motivos que nos permitem interpretar a profissão de motoboy como uma das mais arriscadas e injustiçadas do mundo contemporâneo, haja vista a sua importância para a dinâmica das relações que vivenciamos cotidianamente. É o motoboy que nos entrega o botijão de gás, a encomenda tão esperada, a pizza naquele dia que desejamos não cozinhar, as flores do aniversário de casamento, namoro ou noivado, até mesmo nos tira de um engarrafamento para chegarmos dentro do prazo quando temos um compromisso inadiável.
No terceiro capítulo, São Paulo: Cenário da Velocidade, temos a presença de gráficos elucidativos e trechos de depoimentos dos motoboys entrevistados pela autora, numa passagem que explicita mais detalhes sobre as reformas urbanas e desenhos de uma cidade que parece ser um cenário desvantajoso para as travessias destes personagens da mobilidade. Interessante observar que mesmo retratando a capital paulista, o texto permite associações com qualquer cidade brasileira movimentada na atualidade. Silvana Andrade explica que não foi apenas o governo o responsável pela criação de um espaço social caótico, mas também as pessoas embriagadas pela modernização e progresso, desde os primeiros anos do século XX. Ela reflete sobre a formação das periferias e o surgimento dos cortiços. A construção da identidade dos motoboys também é delineada, ora como imagem da praticidade de nosso cotidiano, ora como figura perigosa que representa, de maneira estereotipada, o crime, o roubo, o perigo.
A autora conclui resumindo os principais pontos do livro e reflete sobre o desenvolvimento das relações comerciais em nossa sociedade, cada vez mais frenética e necessitada da circulação intensa de mercadorias. O motoboy, parte integrante do esquema de informalidade que rejeita a sua integridade e o coloca num cenário de vulnerabilidade, é a peça chave desta movimentação. Pelas tais artérias que conectam as cidades, isto é, as ruas, travessas, vielas, dentre outros espaços de circulação urbana, tais profissionais colocam as suas vidas em risco para o alcance de metas que o deixem diante do mínimo digno a qualquer ser humano. Alimentação, pequenos momentos de lazer, dar conta dos débitos, etc. Os responsáveis pela fluidez de mercadorias no âmbito da mobilidade contemporânea estão sempre expostos aos riscos de invalidez e morte diante dos sinistros de trânsito, bem como mergulhados num projeto perverso de regulamentação que muitas vezes inviabiliza as suas chances de ascensão social. Ser motoboy é um caminho para muitos jovens que se deparam com as parcas oportunidades, oriundos de um meio onde a sobrevivência é dura e impiedosa. Conscientes da desigualdade, eles optam por ser este talvez um dos únicos caminhos para uma atividade que possa gerar renda. Quando dizem que “todo mundo cai algum dia”, trecho comum nos relatos dos entrevistados pela autora, estes jovens demonstram também a consciência diante dos riscos diante da atividade perpetuada cotidianamente, enraizada em nosso sistema por meio de um processo de terceirização cada vez mais precário, num desdobramento de desigualdades que parece não encontrar fim.
Leonardo Campos é Graduado e Mestre em Letras pela UFBA.
Crítico de Cinema, pesquisador, docente da UNIFTC e do Colégio Augusto Comte.
Autor da Trilogia do Tempo Crítico, livros publicados entre 2015 e 2018,
focados em leitura e análise da mídia: “Madonna Múltipla”,
“Como e Por Que Sou Crítico de Cinema” e “Êxodos – Travessias Críticas”.
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A Corrente do Bem
No texto de hgoje, o professor Leonardo Campos fala sobre as relações entre cinema e ensino de matemática
Dizem que gentileza gera gentileza. No desenvolvimento do drama A Corrente do Bem, a vida não é nada gentil com o protagonista da narrativa em seu desfecho, no entanto, o legado deixado pelo jovem após colocar em prática um trabalho escolar nos demonstra como boas ações ainda podem ser possíveis num mundo colapsado por comportamentos egoístas, relacionamentos tóxicos, desigualdade social bastante violenta, dentre outras celeumas que acompanham a humanidade em seu processo evolutivo. Lançado em 2000, sob a direção de Mimi Leder, responsável por conduzir o roteiro de Leslie Dixon, dramaturga que toma como ponto de partida, o livro homônimo de Catherine Ryan Hyde, o filme nos apresenta a trajetória de um garoto cheio de ideais, influenciado pelas ideias de seu professor, se tornando responsável por colocar em prática um projeto considerado utópico, mas que funciona de maneira muito eficiente e muda a realidade de diversas pessoas que gravitam em torno de sua existência.
Na trama, o professor Eugene Simonet (Kevin Spacey) ministra um componente curricular que podemos definir como “Estudos Sociais”. Todo ano, ele aplica um projeto em suas aulas, mas como é de se esperar no âmbito educacional em escala global, a sua expectativa é que alguém apresente algo transformador, no entanto, a realidade comprova a cada período o contrário. Trabalhos repetitivos, nada inovadores, sempre focados na mesmice. Desta vez, diferentemente do esperado, há uma proposta bastante peculiar, desenvolvida pelo jovem Trevor McKinney (Haley Joel Osment). O garoto cria uma corrente do bem, inspirado no projeto do professor que pede aos seus estudantes uma proposta capaz de mudar o mundo. Assim, Trevor pensa em algo para fazer pelo outro que não possa fazer para si mesmo. Em sua ideia, ele pretende promover uma ação para três pessoas, indivíduos que, por sua vez, fazem para mais três, e assim, em progressão aritmética, permite que o bem se espalhe por meio desta corrente.
Utópico, Trevor é desacreditado pelos colegas de sala de aula, mas observado com admiração por seu professor, alguém que inicialmente acha a proposta grandiosa demais, no entanto, abraça fortemente a ideia do estudante que rapidamente coloca o ideal em ação, para o espanto de muitos, inclusive de sua mãe, surpreendida pela presença de um estranho em casa após chegar de uma maratona de drinques servidos em seu trabalho na madrugada. O que começa com 3 parte para 9, depois para 27 e assim sucessivamente, numa progressão que sai de Las Vegas e se espalha pelos Estados Unidos, ganhando visibilidade na mídia e modificando a vida de todos que são tocados por esta corrente. Ao romper barreiras geográficas, numa era antecessora ao advento dos aplicativos e redes sociais, as ideias do jovem Trevor contaminam. Para o espectador mais exigente, focado no cinema enquanto estética e narrativa, A Corrente do Bem é puro exagero. Excessivamente dramático, é um daqueles filmes que imploram ao público por lágrimas, em especial, no desfecho trágico que tira todos os envolvidos de seus eixos.
Mas, é também uma lição sobre o quão podemos criar coisas grandiosas, mesmo numa existência turbulenta.
A vida do pequeno Trevor não é nada fácil. Ele convive com a sua mãe, Arlene (Helen Hunt), uma mulher que trabalha como garçonete nas noites de uma boate de strip-tease, além de outras funções em estabelecimentos do ramo de atendimento durante um dia, uma pessoa que batalha bastante para dar sustento ao filho, mas sequer possui tempo hábil para acompanhar os seus estudos e crescimento, algo que tradicionalmente se esperar num mundo de obrigações da maternidade. Ademais, Arlene sofre de alcoolismo e ainda tem no pai de Trevor um fantasma assombroso, prestes a reaparecer a qualquer momento, personagem interpretado por Jon Bon Jovi. Ele é um homem nocivo, com histórico de violência doméstica, criatura que pode aparecer a qualquer instante e elaborar o caos dentro de casa, medo que acompanha o garoto, mesmo com as promessas de sua mãe sobre nunca mais aceitar o indivíduo novamente, principalmente depois que Trevor testemunhou situações de agressão e ficou bastante traumatizado.
Esteticamente, A Corrente do Bem funciona assertivamente. Os figurinos de David Rosenbloom são críveis e funcionam como elemento de identificação dos personagens com as suas necessidades dramáticas e perfis. Na direção de fotografia, Oliver Stapleton consegue captar, por meio de enquadramentos eficientes, as emoções propostas pela narrativa, dando também ênfase ao design de produção de Leslie Dilley, cuidadoso tanto no ambiente escolar quanto na casa de Trevor e Arlene. Para quem possui uma compreensão básica de cinema, não é difícil reconhecer o estilo de Thomas Newman, responsável pela trilha sonora, no desenvolvimento dos 123 minutos de A Corrente do Bem, condução musical que lembra bastante os seus trabalhos em Beleza Americana e Erin Brockovich: Uma Mulher de Talento, isto é, uma sonoridade condizente com o movimento visto em tela, espécie de composição didática que nos ajuda a ampliar as reflexões sobre os temas abordados pela produção. Em linhas gerais, um ótimo trabalho.
Agradando ou não enquanto narrativa, A Corrente do Bem suscita uma série de questionamentos. É um daqueles filmes ideais para trabalhos escolares em projetos transdisciplinares ou o que chamamos de “cinema espelho” para professores assistirem em suas formações continuadas, tendo em vista refletirem sobre as suas práticas docentes. Dentro os debates, na época de seu lançamento, muita gente comentou a injustiça da lição final, pois mesmo após criar algo tão grandioso, o garoto tem a sua vida arrancada ao tentar defender um colega vítima de agressão por valentões da escola, uma realidade não apenas estadunidense, mas algo de escala global, uma das preocupações para quem vive dentro dos muros escolares cotidianamente. Para estas pessoas, quando meus interlocutores, sempre devolvo a pergunta, provocando sobre, de fato, a vida ser assim em muitos momentos, afinal, “coisas ruins acontecem com pessoas boas”, não é verdade? Ademais, a narrativa é elucidativa ao ser utilizada como reflexão de vida, em especial, para aqueles que atuam com liderança, empreendedorismo e educação.
Sempre exponho, como crítico de cinema e professor, o potencial do cinema não apenas como entretenimento, mas também como elemento motivador em diversas esferas de nossas vidas. Ao debater A Corrente do Bem, por exemplo, elucido o caráter pedagógico da trama ao permitir que professores repensem as suas práticas, mesmo em cenários de muita tensão. No personagem de Kevin Spacey, o professor responsável por ressoar os seus ideais no pequeno Trevor, podemos observar o quão o educador precisa compreender sobre a realidade dos seus estudantes, figuras que são parte de um microcosmo, sujeitos como o próprio mentor, capazes de conduzir ações, estabelecer condutas inteligentes e realização de julgamentos pertinentes, mesmo sem a especialização e formação dos docentes, algo a ser pensado numa era que ainda traz, habitados em sala de aula, profissionais que acreditam na intocabilidade de seus conhecimentos em relação ao que o estudante traz enquanto experiência, num modelo de ensino autocrático e defasado.
Ainda sobre educação, creio ser pertinente também pensar A Corrente do Bem como uma narrativa que traz um professor capaz de permitir o desenvolvimento da autorresponsabilidade de seus estudantes nas dinâmicas em sala de aula. Mesmo sendo complexo, afinal, Trevor e muitos de seus colegas são oriundos de uma região conhecida periférica da cidade, a ação demonstrada no projeto de Eugene Simonet dialoga com os princípios da cidadania, das práticas que desenvolvem habilidades e competências capazes de transformações, mesmo que pequenas, no entorno dos envolvidos, situações que ressoam em suas existências futuras. É o olhar para o mundo como protagonista, em posturas individuais capazes de estabelecimento da diferença. Trevor é um personagem desafiador, pois conduz a sua presença em aula com participação ativa, questionando quando não compreende determinadas ideias ou discorda de posicionamentos. Persistente, ele reage mesmo diante das dificuldades na execução de sua missão.
É isso, mesmo sendo demasiadamente idealista, que esperamos de nossos estudantes enquanto professores. Não é mesmo? Ao menos, conforme relatos de colegas na experiência docente, ansiamos por salas de aula preenchidas por indivíduos interessados em modificar as suas realidades, num processo que transforma a todos os envolvidos. Dentre outras discussões relevantes, A Corrente do Bem nos ajuda a pensar os nossos projetos inovadores e o impacto causado nas famílias, muitas vezes, receptores que enxergam propostas diferenciadas como coisas fora da curva e desnecessárias para os seus filhos, pessoas que em tese, deveriam aprender conceitos mais imediatos e supostamente práticos para a vida. Curioso observar também como Trevor não se importa com a nota em si, mas com o desenvolvimento de seu processo, em algo bastante debatido sobre mudanças estruturais nos processos avaliativos em voga na contemporaneidade, ainda focada no boletim como indicador de resultados.
Para uma proposta matemática, A Corrente do Bem traz reflexões sobre a lógica da multiplicação. Quantas pessoas conseguiram ser atingidas pela ação de Trevor? Em suas respectivas participações, basta que um indivíduo realize algo por três pessoas e essas três pessoas realizem algo para mais três e assim sucessivamente, adentrando na progressão geométrica e permitindo, assim, que compreendamos numericamente uma determinada situação. Aqui, temos a fase 0, constituída pela primeira pessoa da corrente, neste caso, Trevor, seguido da fase iniciada pelas pessoas que ele beneficiou e, consequentemente, os contemplados pelas ações destes beneficiados. O protagonista ajudou a pessoa em situação de rua, depois a sua mãe, juntamente com o seu professor. Por meio do lema Pay For Foward (Passe Adiante), estas pessoas conduziriam as suas ações garantindo que os demais sigam o esquema. Desta maneira, um professor de matemática, por exemplo, pode debater o filme em propostas transdisciplinares e, assim, permitir que o aprendizado seja amplificado por uma observação filosófica deste campo do saber humano tão essencial para a nossa formação escolar e cidadã.
Para uma proposta em sala de aula, você pode iniciar uma discussão posterior ao processo de exibição do filme com um mapa mental. Observe.
Para consolidação do conhecimento, numa proposta com o filme em sala de aula, o professor pode trabalhar com questões objetivas (múltipla escolha, asserção/razão, complementação simples), discursivas (com descritores que permitam a resolução de um problema), a criação de um projeto com a turma, numa ação coletiva iniciada com observações individuais, além de solicitar a elaboração de mapas mentais sobre o relacionamento das ideias do filme com lógicas de multiplicação e progressão geométrica. Ao lado de um professor de Produção Textual, o responsável por estudos matemáticos pode ampliar as reflexões com uma proposta de redação, juntamente com debates sobre o assunto em componentes curriculares diversos, tais como Filosofia, Sociologia, História, Geografia, Cultura Digital, Projeto de Vida, dentre outros.
Já pensou numa articulação entre as ideias de A Corrente do Bem com debates sobre uma ação do tipo na era das redes sociais e aplicativos? É um ponto de partida pertinente para Cultura Digital, também capaz de ressoar nas propostas de intervenção de uma produção escrita. Pensado como filme para um projeto maior, as discussões sobre os limites geográficos da corrente de Trevor podem culminar numa interessante roda de conversa em nas aulas de Geografia. Para Projeto de Vida, há peculiaridades do filme que aproximam a sua narrativa das reflexões sobre como os estudantes pretendem delinear as suas trajetórias e, consequentemente, as dinâmicas de seu entorno. Assim, tem-se um instigante debate sobre construção da cidadania. Dá até mesmo para elaborar seminários onde grupos construam apresentações com suas próprias propostas para um mundo melhor, tendo tópicos como introdução, objetivos (o geral e os específicos), justificativa, problema/hipótese, processos metodológicos, dentre outros, construindo uma ponte segura entre o Ensino Fundamental e Médio com as demandas do Ensino Superior e a vida profissional dos estudantes, mais preparados e conscientes dos mecanismos da metodologia da pesquisa para melhor desenvolverem as suas respectivas formações intelectuais.
Leonardo Campos é Graduado e Mestre em Letras pela UFBA.
Crítico de Cinema, pesquisador, docente da UNIFTC e do Colégio Augusto Comte.
Autor da Trilogia do Tempo Crítico, livros publicados entre 2015 e 2018,
focados em leitura e análise da mídia: “Madonna Múltipla”,
“Como e Por Que Sou Crítico de Cinema” e “Êxodos – Travessias Críticas”.
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A leitura como hábito para o crescimento pessoal
Ler abre diversas portas em nossas jornadas pessoais e profissionais, sabia?
Há estudos que comprovam a eficiência dos hábitos de leitura para proteção do cérebro, pois pessoas que leem com frequência tem menor chance de desenvolver demência e diminuem os riscos do Mal de Alzheimer, além de ter uma rotina com cargas de estresse reduzidas, pois ler permite viagens tão relaxantes quanto ouvir música, permitindo que a carga do cotidiano seja suavizada. As pessoas que tem na leitura um hábito permanente também conseguem desenvolver mais empatia, sabia? Ao ler, o indivíduo pode compreender mais o que o “outro” sente e, assim, por meio das experiências em suas jornadas literárias, consegue interpretar melhor comportamentos e fazer ilações que podem ser úteis para as suas relações interpessoais cotidianas. Tão importante quanto o exercício físico é o treino da mente, por isso, aderir ao processo constante de leitura permite que tal segmento tenha atuação nos diferentes circuitos neurais e nesta dinâmica, processos de estimulação cerebrais promovam mudanças significativas em sua maneira de agir e pensar. Ademais, ler ajuda na aprendizagem de conteúdos diversos, pois influencia a forma como lidamos com os diversos assuntos, além de ampliar o nosso vocabulário. Por isso, ler deve ser parte de sua rotina diária, tal como se alimentar e dormir.
Mas, afinal, quais são os principais tipos de leitura?
Como posso organizar uma eficiente rotina de leitura?
Primeiro é preciso começar de algum lugar. Se for literatura e você não tiver ainda habituado, comece por crônicas e contos, indo posteriormente para os romances. É uma maneira de não enfrentar volumes maiores de texto e estabelecer barreiras que o desanime. Se sua jornada diária estiver conectada com o mundo acadêmico, treine também com a leitura de textos científicos de sua área, tendo em vista ampliar os seus horizontes interpretativos e promover o conhecimento acerca de modalidades mais diversas de escrita. Muita gente me questiona sobre iniciar com os livros físicos ou investir nos digitais. Sinceramente, apesar da pegada sustentável e da mobilidade dos e-books, ainda prefiro aderir aos livros impressos, pois acredito que haja uma relação maior de pertencimento e descanso, também, para a visão, fora que nos suportes digitais, a tendência para mudarmos da leitura para redes sociais, aplicativos e outras distrações é bem maior. Assim, sem fundamentação científica, prefiro o físico, mas depende muito do desprendimento do leitor.
Dizem que ler durante a noite dá sono, por isso, invista em leituras diurnas, não apenas nas pausas, mas em deslocamentos no metrô, dentre outras paradas e travessias. É uma maneira bacana de exercitar a mente, principalmente para aqueles desacostumados com a prática tão necessária para se manter relevante socialmente na contemporaneidade. Ademais, não esqueça de carregar consigo um livro, em qualquer oportunidade, pois nas passagens do seu dia, a leitura pode se tornar uma belíssima opção de acompanhamento, seja na fila de um banco, de loja ou na sala de espera para um atendimento clínico. Crie, para você, as oportunidades, para que a prática da leitura se transforme uma rotina orgânica do cotidiano. Para isso, é importante que não haja desistência no primeiro obstáculo, combinado? As conquistas neste processo não estão garantidas como numa ciência exata, mas é bem possível que aliando Hábitos de Leitura com Conhecimentos Gerais, você turbine o seu perfil profissional e as suas habilidades e competências no âmbito do pleno exercício de sua cidadania.
Leonardo Campos é Graduado e Mestre em Letras pela UFBA.
Crítico de Cinema, pesquisador, docente da UNIFTC e do Colégio Augusto Comte.
Autor da Trilogia do Tempo Crítico, livros publicados entre 2015 e 2018,
focados em leitura e análise da mídia: “Madonna Múltipla”,
“Como e Por Que Sou Crítico de Cinema” e “Êxodos – Travessias Críticas”.
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Argumentação e escrita nas questões discursivas
Leia, coloque as sugestões em prática e ótimos estudos, combinado?
Na dinâmica dos concursos, vestibulares e processos avaliativos, tal como o ENADE, as questões discursivas se estabelecem como um grande desafio para os candidatos. Sabemos que a escrita fluente é algo que se relaciona diretamente com hábitos de leitura, por isso, apesar de macetes e sugestões para melhoria da estrutura de um texto escrito neste tipo de ocasião, desenvolver uma rotina de estudos que contemple assertivamente o treinamento para a elaboração de textos argumentativos é um dos caminhos não apenas para situações avaliativas, mas também algo a ser levado para a vida. Escrever bem permite a abertura de portas no competitivo cotidiano profissional, além de permitir que possamos colocar para a apreciação do outro, as nossas ideias, desde as legendas em redes sociais, aos e-mails que enviamos, nos discursos que precisamos elaborar em situações especiais ou qualquer modelo de mensagem que tenha como direcionamento, passar uma mensagem eficiente para nossos receptores.
No caso das questões discursivas, o candidato precisa levar em consideração que os seguintes aspectos serão avaliados em sua jornada argumentativa: a explicação e solução para um determinado problema apresentado, a aplicação de conteúdos aprendidos sobre assuntos pontuais para aplicação em situações inovadoras, argumentação que trace comparações ou classificação de dados e informações, estabelecimento de relações de causa e efeito ao longo da exposição argumentativa, demonstração da capacidade de sintetizar ideias sem prejudicar a dinâmica da escrita, formulação de conclusões com base nos elementos fornecidos ao longo do enunciado que deve ser lido e atendido adequadamente, bem como comprovar a habilidade de manter organizado, por meio da escrita, as ideias, de maneira lógica, coesa, coerente, pois neste processo avaliativo, são levados em consideração, as suas estratégias argumentativas, vocabulário minimamente expressivo e adequação gramatical, ou seja, elementos básicos de regência e concordância verbal e nominal, acentuação, pontuação, dentre outros.
Quando ministro aulas, oficinas e cursos sobre escrita para este tipo de situação, geralmente aconselho os candidatos a não escrever parágrafos longos demais, tendo em vista evitar a perda de coesão com as possíveis inadequações no uso da vírgula. Demonstrar erudição é importante, mas utilizar palavras que fogem do significado daquilo que se pretende dizer pode ser um problema, por isso, sempre indico que saiba usar adequadamente cada palavra empregada no texto. Divagações podem funcionar no discurso oral, mas na escrita, é preciso optar pela objetividade, pois neste esquema avaliativo, o número de linhas disponíveis para a argumentação precisa ser atendido sem prejuízo ao conteúdo das ideias. Sendo assim, torna-se fundamental manter-se atento ao tema e ao enunciado, para evitar fuga do que é solicitado ou transparecer que está enrolando por não saber muito sobre o que foi proposto. Neste ponto, adentramos nas discussões sobre atualidades. Entender um pouco de muitas coisas pode ser o guia de sobrevivência para quem está num processo avaliativo.
É claro que devemos ser especialistas de determinados assuntos, próprios de nossa área de atuação, mas conhecer um pouco do que é tema recorrente no mundo contemporâneo é parte de nosso ingresso para circular por espaços diversos. Quem vos escreve, por exemplo, é formado em Letras e Cinema, mas não significa que tenha que me limitar e não dialogar sobre Meio Ambiente, Educação, Segurança Alimentar e Nutricional, dentre outros assuntos que se tornaram tangenciais em meu cotidiano, por motivos diversos, muito além da preparação de projetos para o ENADE. Assim, na questão discursiva, além da organização das ideias, do devido fluxo de conhecimentos gerais para reflexão, relação e aplicação de conceitos, controle do espaço disponível para respostas e citações relevantes, é preciso também aderir ao rascunho, algo que muitos estudantes preferem fugir, sem sequer imaginar que essa postura pode ser prejudicial ao texto que escreve, pois é no rascunho que habita a elaboração das ideias.
Diante do exposto, o seu uso deve ser considerado indispensável. O rascunho serve para o autor se comportar como uma espécie de leitor crítico de sua própria composição textual, numa dinâmica que permite a elaboração de alterações antes de entregar a versão argumentativa final, tendo na revisão, a melhoria na qualidade do que escreveu. Rascunhar é treino, hábito de dedicação para aqueles que desejam os melhores resultados. Um paradoxo, por exemplo, no meio do texto, pode ser resolvido quando o autor relê o que compôs e reorganiza as ideias de sua produção. Ao rascunhar, o candidato tem a chance de reler a proposta, anotar as suas ideias, criar sentido entre os elementos elencados para compor o texto e, assim, determinar melhor o começo, o meio e o fim de sua escrita. Ademais, além destas dicas valiosas, proponho sempre que o indivíduo responda as questões de provas anteriores, uma ótima solução para treinamento, afinal, na questão discursiva, o “chute” não é uma possibilidade.
Ao lidar com uma questão discursiva, o candidato precisa ter em mente que vai elaborar um texto com introdução, desenvolvimento e conclusão. Neste tipo de produção textual, é preciso iniciar com uma declaração afirmativa ou negativa sobre algo, desenvolver contemplando de maneira explicativa todos os pontos para, mais adiante, concluir com uma proposta de intervenção ou solução para o tema explorado. E, como costumo dizer aos meus estudantes, sair do clichê que delega apenas ao Estado as obrigações diante de uma situação problemática que requer ajuste. Sociedade civil, espaços educacionais, a mídia, ONGS e tantos outros setores de nossas vidas podem ser responsáveis por abraçar causar necessárias para a mudança do que está estabelecido. Outro ponto que destaco é a importância de cuidar da caligrafia e manter a legibilidade do que está escrito, afinal, a banca avaliadora consta de seres humanos, não de robôs que fazem uma leitura programada. Respeitar os limites das linhas, margens e parágrafos também é muito pertinente, pois se passa uma ideia de organização da arquitetura textual.
Censura nunca é e nunca deve ser uma opção, mas nas questões discursivas, precisamos evitar discursos demasiadamente inflamados, isto é, ser coerente e coeso na militância, evitar posições partidárias que prejudiquem a escrita, como por exemplo, “todo bandido deve ser morto” ou “todo político é ladrão”. Se afastar de abordagens categóricas também é algo muito problemático, tipo “todo gay é afetado” ou “todo branco é um racista”, dentre coisas do tipo, inacreditavelmente muito comuns em respostas e redações de processos avaliativos. No enunciado, há um manancial de palavras-chave que precisam ser inseridas na sua produção, num texto que deve ir direto ao ponto e prezar pela objetividade. Ademais, escrever com autonomia também é um ponto importantíssimo, pois é necessário fundamentar a sua argumentação com teorias e discursos especializados, mas evitar frases prontas, apontamentos vagos e atribuir erroneamente algumas máximas aos autores errados. Um exemplo: citar algo de Clarice Lispector e atribuir ao Arnaldo Jabor, dentre outros deslizes, também bastante costumeiros.
Aos leitores, desejo uma excelente jornada de escrita, continuem praticando e, se ainda não começaram, a hora é agora, combinado?