Alex Curvello é advogado e presidente da Comissão de Direito Previdenciário da Subseção do Litoral Leste do Ceará @alexcurvello
Sua cultura era vasta, sua idade era avançada, mas extraia a delicadeza de todas as situações, ele respeitava cada local que passava e tentava aprender, mesmo que com um “moleque” de 20 e poucos anos, ele dialogava normalmente.
Nesse Papo de Quinta especial venho lembrar dos dois anos de falecimento de um homem que tive pouco contato, mas que deixou um ensinamento que até hoje persiste em meu coração.
Franchesco, um italiano, casado com uma tia muita amada, Mara, natural de Salvador, que passaram juntos umas férias em Fortaleza e tive o privilégio da convivência.
Lembro muito bem da forma como ele falava das suas experiências de vida, gostava de escutar e aprender, histórias do Ceará, dos pescadores e de muitas curiosidades que ele tinha.
Valorizava as refeições com todos juntos, da relevância de comermos todos unidos para saborear o alimento, e o momento. Não importa qual era a iguaria, contanto, que fosse feito com amor. Era um verdadeiro gourmet.
Algumas situações marcaram minha pouca convivência com eles, o amor que sentiam um pelo outro, a história de como se conheceram, a devoção e o carinho que minha tia sempre dedicou a ele e o cuidado que ele tinha por ela na tentativa de permanecerem sempre juntos.
O que mais me marcou da época que conheci Franchesco foi quando em um de nossos diálogos, comentei o quanto achava que o Brasil era atrasado em relação a certos países da Europa, inclusive a Itália do qual ele era originário.
Explanei meus pensamentos e ele escutou atentamente, falei pelo que conhecia dos Europeus, eram mais educados, respeitavam sua história, apreciavam sua cultura e viviam em uma unicidade, sem falar dos poucos índices de violência, corrupção e pouca desigualdade social.
Ele, após minha fala disse que ia contar uma história e que acreditava do fundo do coração dele, que essa desigualdade social, violência e corrupção vivida no Brasil, infelizmente para ele dificilmente mudaria, apenas se acontecesse em nosso país o que aconteceu no dele e que ele vivenciou.
Lembro-me até hoje, ele falando “amore mio” como ele chamava muitos a quem tinha um carinho, “para mudar algo definitivamente em um país, apenas passando por uma guerra, eu senti o peso de uma guerra, de uma bomba cair, você perder tudo até as identidades, bancos fecharem, mercados, alimentos escassos e muitas outras atrocidades, senti na pele.”
E então eu compreendi, só após um país sofrer por igual ele pode erguer-se por igual, o que ele quis dizer e até onde pude compreender é que os considerados “ricos” só irão fazer algo de fato para mudar a vida do “pobre” quando ele se torna um e aquele que comete algum delito só deixará de cometer quando sentir na pele a angústia de perder tudo.
Por fim ele perguntou; “amore mio, para que o Brasil se torne um país melhor, você deseja passar por uma guerra?”
Confesso que até hoje não tenho essa resposta, mas tenho no coração uma vontade mesmo que utópica que possamos um dia ser um país mais justo, sem precisar passar por uma guerra, além do propósito de conhecer a Itália e passear pelos locais por onde ele falava com tanta paixão.