Bahia Pra Você

Rota de Colisão

Leonardo Campos

Os impactos dos sinistros de trânsito, fatais ou com vítimas acometidas por sequelas, tragédias que antes eram chamadas de acidentes, são apresentados por meio de um texto coeso, coerente e dinâmico em Rota de Colisão: A Cidade, O Trânsito e Você, publicação de 2007, assinada pelos especialistas Eduardo Biavati e Heloisa Martins. O termo acidente, como nós sabemos, expressa algo imprevisto, furtivo, diferente do que contemplamos com horror em nosso cenário de mobilidade cotidiano, espaço onde situações evitáveis poderiam não acontecer e ceifar tantas vidas ativas, numa celeuma que causa desordem não apenas diante dos familiares e amigos enlutados, mas também ocasiona graves crises econômicas para uma nação que deixa de realizar amplos investimentos em outras áreas para atender aos vitimados com sequelas, dependentes de aposentadorias, bem como as cifras que os sinistros custam para o SUS.  No livro, a cidade não deixa de ter a sua culpa. Zonas com infraestrutura inacabada, projetos problemáticos, assim como o comportamento humano no trânsito, carente de educação por parte de muitos condutores, pedestres e ciclistas. Focado na importância do exercício da cidadania, o conteúdo em questão é fluente, de poucas páginas e funciona como material para educar a população em geral, além de ser subsídio básico para projetos de educação para o trânsito.

Ao longo de suas 93 páginas, Rota de Colisão: A Cidade, O Trânsito e Você debate segurança e cidadania no trânsito em seus seis capítulos curtos, todos ilustrados e com desenvolvimento de ideias pedagogicamente dinâmicas para o entendimento de todos os públicos. Trânsito e Transitar, o primeiro capítulo, versa sobre como o movimento das ruas depende da atividade humana que acontece ao redor dos espaços de circulação, apresentando questões sobre o desenho das cidades e a solução de alargamento das pistas como uma opção que não resolve os problemas no cenário da mobilidade urbana contemporânea, algo que envolve demolição de prédios, casas, indenizações, dentre outras circunstâncias. Construir novas avenidas em zonas já estabelecidas não é algo tão tranquilo quanto se imagina. Os autores refletem a quantidade de carros na rua, a questão do meio ambiente degradado pelos combustíveis e o desinteresse da população pelos modais no deslocamento, não apenas por culpa dos usuários, mas pelas condições precárias de transporte em muitas zonas urbanas brasileiras.

No desenvolvimento de As Regras: De Quem é A Vez, o texto relaciona os espaços urbanos com regras de um jogo, onde precisamos seguis as orientações adequadamente para vencer as etapas e conquistar a linha de chegada. São alegorias importantes para transformação do que está previsto por lei em explicações pedagógicas para o grande público. Obedecer às regras é algo chato? Sim, mas estamos num espaço coletivo, por isso, temos que levar em consideração os nossos interesses, mas as vontades alheias, afinal, não somos donos da rua. Existem centenas de regras no Código de Trânsito Brasileiro, a maioria, desconhecida pela população, sendo uma delas o destaque do capítulo: a hierarquia de responsabilidades ao trafegar, espaço que tem o pedestre como elemento mais frágil diante de ciclistas, carros, caminhões e ônibus.

Em Os Acidentes: Onde Mora o Perigo, terceiro capítulo da jornada de Rota de Colisão: A Cidade, O Trânsito e Você, encontramos algumas pontuações sobre os chamados acidentes, agora sinistros de trânsito, conforme a atual legislação, eventos que não devem ser pensados como obras do destino, mas acontecimentos que podem ser evitados se todos que circulam pelas vias da cidade obedecessem ao que está disposto no CTB e também respeitasse o lugar de passagem de cada um. O grande índice de tragédias nas vias não para de crescer pelo fato de nós, agentes do processo de mobilidade cotidiana, não respeitamos adequadamente o outro, colocando-se muitas vezes como irresponsáveis. Uso de álcool, mesmo na quantidade mínima, não por o cinto de segurança e exceder a velocidade: três grandes problemas contemporâneos, somados ao mais recente de todos, o uso de celular na direção, situação que está, atualmente, entre as três mais perigosas e registradas nos casos de colisão e atropelamento no mundo.

No elucidativo Atropelamento e Lesão Cerebral, os autores falam sobre como a mídia menciona as tragédias, mas não dá o mesmo enfoque para as vítimas não fatais, figuras da tessitura cotidiana que custam muito para os cofres públicos, sejam por seus tratamentos ou processos de aposentadoria. No Brasil, a maioria dos sinistros ocorre entre sexta-feira (noite) e domingo (final da tarde). Por que será? No mundo de hoje, diríamos que é porque “sextou”. E é exatamente por isso, o que nos abre as portas para conteúdo de Álcool, óbvio e quase senso comum, mas parece que ainda não nos alertamos assertivamente para esta substância que é, ao lado do excesso de velocidade, um dos elementos responsáveis pelas tragédias no trânsito, algumas irreversíveis para os envolvidos. No desfecho, temos Colisões e Lesão Medular, uma exposição dos problemas causados em determinadas situações de sinistro. Os autores explicam o que ocorre com o nosso corpo por meio de exemplos que reforçam a pequenez dos humanos diante dos impactos da dinâmica física de uma colisão ou atropelamento. É tudo muito assustador, mas ainda assim, nos pegamos sem seguir as orientações para evitar tudo aquilo que é mostrado nos casos descritos pelo livro.  Ademais, em seu encerramento, os autores pedem reflexão e postura dos leitores, fornecendo ótimas sugestões de leitura complementar.

Leonardo Campos é Graduado e Mestre em Letras pela UFBA.
Crítico de Cinema, pesquisador, docente da UNIFTC e do Colégio Augusto Comte.
Autor da Trilogia do Tempo Crítico, livros publicados entre 2015 e 2018,
focados em leitura e análise da mídia: “Madonna Múltipla”,
“Como e Por Que Sou Crítico de Cinema” e “Êxodos – Travessias Críticas”.
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