Por Leonardo Campos
Para alguns, o termo vulgar “lepra” é a referência geral para essa doença carregada por estigmas ao longo de sua história. Diferente dos mitos que são divulgados por notícias falaciosas, a Hanseníase é uma condição que tem cura e pode ser devidamente tratada. Na entrevista de hoje para a nossa coluna semanal sobre Saúde e Bem-estar, a bioorganizer Patrícia Seixas nos fala sobre a hanseníase, sua relação com o tema, dentre outros tópicos sobre esse assunto pontual no atual cenário da saúde pública brasileira.
Professora Patrícia Seixas, a hanseníase ainda é um problema atual?
Sinto muito dizer, mas a hanseníase ainda é um problema atual e está listada dentre as chamadas doenças tropicais negligenciadas, que atingem populações mais vulneráveis, e o nosso país, vergonhosamente, encontra-se em segundo lugar em número de casos, perdendo somente para a Índia. No Brasil, a média é de 30 mil novos casos por ano, por isso, podemos afirmar que a hanseníase foi e é uma doença estigmatizada e negligenciada até os dias de hoje.
Mas, afinal, em suas palavras, o que a hanseníase?
A Hanseníase é uma doença secular, que foi descrita por Hipocrátes, 400 anos antes do nascimento de Cristo, e é uma doença que existe até os dias de hoje. Ela é causada por uma bactéria, a Mycobacterium leprae, que é transmitida de pessoa a pessoa, através do contato aéreo, mas esse contato não é um contato rápido de encostar ou de encontrar uma pessoa na rua, no metrô, que ela já é transmitida não. Ela é transmitida no contato íntimo, durante cerca de mais ou menos 5 anos de convívio, com uma pessoa doente que ainda não iniciou um tratamento para Hanseníase.
![doença carregada por estigmas ao longo de sua história. Diferente dos mitos que são divulgados por notícias falaciosas, a Hanseníase](https://bahiapravoce.com.br/wp-content/uploads/2021/05/Imagem-no-corpo-da-entrevista.png)
Professora Patrícia em campanha para o Janeiro Roxo 2021 no Instagram @eusoubioorganizer
E como podemos chegar ao diagnóstico da hanseníase num indivíduo?
Essa doença é facilmente diagnosticada por um clínico geral ou um dermatologista, e o tratamento é dado de graça pelo SUS, pelo Sistema Único de Saúde, nos postos de saúde para todos os pacientes. É um tratamento que demora de 6 meses a 1 ano, com remédios a serem tomados todos os dias. O paciente tomando essas medicações e recebendo acompanhamento supervisionado, ele vai evoluir para a cura. Muito importante ressaltar: a Hanseníase é uma doença que tem cura.
Um dos grandes problemas, além da saúde comprometida, é o preconceito que gera o estigma. O tratamento, então, se faz importante.
Sim, ao longo da história, as pessoas afetadas pela Hanseníase, continuam sofrendo com o estigma e muita discriminação. É de extrema importância iniciar o tratamento o mais rápido possível, exatamente para impedir a cadeia de transmissão da doença. A descoberta precoce, a detecção dos casos, contribuem muito positivamente, no sentido de exatamente coibir a disseminação da transmissão da doença. Além disso o diagnóstico correto, o tratamento adequado e precoce, são de grande valor para prevenção de incapacidades, principalmente para evitar os danos neurais.
Por isso então temos um dia exclusivo no calendário, não é mesmo? É uma data para falar de medidas contra a discriminação?
O dia mundial de luta contra a Hanseníase é marcado todos os anos no último domingo de janeiro, com o objetivo de aumentar a conscientização sobre a doença e reduzir o estigma contra aqueles que sofrem com ela. Precisamos de medidas para combater a discriminação vivida pelas pessoas afetadas pela Hanseníase. Como assegurar que as pessoas com a doença, assim como suas comunidades, sejam empoderadas a participar ativamente dos serviços de atenção; que aquelas que possuem a doença tenham melhor acesso aos serviços de apoio social e financeiro; que seja promovida a reabilitação baseada na comunidade para pessoas com incapacidades relacionadas à Hanseníase; e que leis discriminatórias sejam abolidas e políticas sejam implementadas para facilitar a inclusão dessas pessoas afetadas por essa doença.
Ao lermos a sua trajetória, há menções sobre um projeto desenvolvido na cidade de Belmonte. Conta para os leitores como foi a experiência. Numa breve pesquisa em seu histórico, parece haver uma paixão intensa pelo tema.
Minha relação e paixão pela Hanseníase, começou quando eu assumi a gerência do Programa de Hanseníase de Lauro de Freitas, nos anos de 2007 a 2010, e depois passei para ser gestora local do subprojeto chamado DCITY em Hanseníase em Belmonte, Bahia, juntamente com a Fiocruz do Rio de Janeiro e do Ministério de Saúde, entre os anos de 2009 a 2012. Nesse período também assumi a gerência do programa de Hanseníase em Belmonte, de 2010 a 2013, os três anos que morei nesse município.
Para finalizarmos, professora, uma pergunta transversal. Compreender esses temas é passear pela pesquisa, por responsabilidade social, dentre outros temas. O que acha dos rumos que devemos tomar na seara do Ensino Superior em nosso país, afinal, essa é uma de suas áreas de atuação.
Creio que professores e alunos da área de saúde necessitam vivenciar um novo sistema de Ensino Superior, sabe? Algo que possa contemplar uma formação mais ampla, preparando os estudantes para a defesa da cidadania com uma capacidade mais crítica, uma habilidade maior para integrar a parte técnica e a parte política, como uma grande construção de um trabalho que pode dialogar para qualificar o ensino da Hanseníase e o compromisso social. A grande responsabilidade social que todo profissional da saúde deve ter.