Marcus Borgón – Escritor
Se não me engano, foi no final dos 80 que Durval Lélys emplacou nas rádios a música “Gabriela”. Me pareceu um caso de homenagem espúria, motivada pelo sentimento de vingança. O vocalista do Asa de Águia, após levar um fora, pegou o violão num lamento e a manhã nasceu… cinzenta! Pura especulação. É sabido que boas intenções não salvam ninguém do inferno. Manifestações e práticas equivocadas, sim, garantem vaga junto ao tinhoso. Ou, neste caso, um lugarzinho no inferno particular da homenageada. O intuito pode ter sido dos melhores, mas a qualidade do produto não o alcançou em estatura. Não sei dizer se a tal Gabriela ficou lisonjeada. Presumo que não. Deve ter agradecido aos pais por ter um nome comum, e assim poder ver diluída a infâmia entre as milhares de gabrielas soteropolitanas.
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Final dos 80. Desde abril, a Piatã FM começava a fazer uma seleção bacana de forró de duplo sentido. Toda noite rolava. Sandro Becker, Zé Duarte, Zenilton. Dizem que o Gonzagão detestava. Só salvava o Genival da execração. Eu adorava. Lá pelas nove da noite, eu sintonizava a rádio no meu walkman paraguaio. Broksonic preto, quase todo mundo tinha um igual.
Velho Lua nem imaginava o processo de pasteurização que ocorreria com o forró. Se ainda estivesse vivo, certamente faria campanha pela volta do duplo sentido (ainda que lhe custasse enfrentar o implacável tribunal das redes sociais). E deixaria a tanga voar…
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O primeiro fora que levei, foi por preferir Pac-Man a River Raid. Ela achava imperdoável. Eu tentei argumentar que era craque no Enduro. Não adiantou nada. Anos mais tarde a reencontrei. Linda. Estava com pressa, iria ao show de Bruno e Marrone. Ela perguntou o que eu andava fazendo. “Assoprando uns cartuchos por aí, mas nem sempre funciona. Às vezes pega, às vezes chuvisca”. Ela disse que sentia saudade “das tardes de joystick na mão”. Não deu tempo de perguntar se ela ainda lembrava da chave “select/reset”. O videogame dela era Odissey, e nessa marca Pac-Man tinha outro nome.