Professor Leonardo Campos
Dos medalhões que compõem a história do subgênero slasher, Halloween: A Noite do Terror foi um dos primeiros a ser reinterpretado para a década de 2000, antes de Jason e Freddy ganharem as suas releituras. Rob Zombie, conhecido por cometer alguns excessos no cinema em paralelo com a sua carreira musical, assumiu a direção e o roteiro do projeto de resgata da franquia com Michael Myers. Ele procurou o cineasta John Carpenter para se situar e o veterano foi categórico: “faça o seu filme, do seu jeito”. E assim nasceu Halloween: O Início, versão turbinada da noite do Dia das Bruxas em Haddonfield, marcada pelo rastro de violência e horror deixados pelo antagonista mascarado. Diferente do que tinha sido proposto em 1978, Myers aqui não é uma mescla de humano e entidade, construído em torno de um curioso enigma. Na versão refilmada, tal como geralmente se faz neste tipo de segmento da indústria, a ideia é esmiuçar ao máximo a mitologia dos personagens para que tudo fique explicado para o tipo de público contemporâneo.
O resultado é um filme interessante, com alguns bons momentos, mas acometido pelos excessos do diretor. Em linhas gerais, explicar Michael Myers por meio da psiquiatria e justificar a sua sanha assassina com base na infância do personagem como um delinquente oriundo de um lar desequilibrado é uma possibilidade viável. Apesar de ter incomodado muitos fãs e outros profissionais do campo da crítica, essa é uma alternativa diferenciada, capaz de justificar as escolhas de Zombie, alguém interessado em criar elementos novo dentro de um universo ficcional amplamente divulgado e reiterado nas numerosas sequências da franquia. O seu problema, no entanto, não é esse processo de desmembramento do mistério em torno de Michael Myers, mas a forma desajustada como ele desenvolve a narrativa longa, de quase duas horas de duração.
Até a metade, temos uma linha própria, como se estivéssemos num reboot, modificada quando o filme se aproxima do final e aproxima-se bastante de uma refilmagem ao estilo Psicose, de Gus Van Sant, passo a passo, com poucos diferenciais. Ademais, os diálogos em muitos momentos ficam esdrúxulos e excessivamente vulgares, com cenas demasiadamente extensas, focadas na violência física para chocar. Compreendemos que a ideia era trazer a sua marca, no entanto, Zombie peca pelos momentos abruptos e violentos demais, desnecessários para impactar, com muitos closes e poucas sutilezas. A atmosfera criada pela trilha sonora de Tyler Bates é também bastante densa, mas ao contrário dos excessos visuais do cineasta, a música surge sob medida para a história, mantendo-se intensa e nos permitindo conexão com a história, mesmo diante dos problemas que não chegam a ser graves e impedir a fruição do filme enquanto entretenimento e até mesmo reflexão, mas convenhamos, incomodam o espectador mais compromissado.
Além da trilha sonora, há dois setores que também cumprem adequadamente as suas tarefas: a direção de fotografia de Phil Parmet, idealizadora de alguns bons momentos, em especial, nas cenas tensas do final, e o design de produção de Anton Tremblay, responsável pelos espaços sombrios por onde os personagens circulam, dispostos no xadrez da vida, tendo Michael Myers como o perigoso elemento ceifador. Como Halloween: O Início é um filme de excessos, não podemos deixar de destacar também o design de som assinado por Barney Cabral, igualmente eficiente no que diz respeito a captação de sonoridades para permitir que Rob Zombie consiga cumprir os propósitos de seu projeto. A história, como sabemos, conta basicamente a noite de retorno de Michael Myers, fugitivo do sanatório onde esteve enclausurado por longos anos.
A prisão, acompanharemos, vem depois que ele aniquila quase todos de sua família após um ataque de fúria. Mata a irmã, o padrasto, sobrando apenas a mãe, uma stripper de um bar pouco conceituado da cidade e a outra irmã, Laurie Strode (Scout Taylor-Compton), adotada por Mason (Pat Skipper) e Cynthia Strode (Dee Wallace), membros do tempo presente da narrativa, figuras que assumiram a bebê depois da tragédia na casa de Michael Myers, interpretado por Daeg Farech quando criança e pelo gigantesco Tyler Mane quando adulto, este, em especial, uma assustadora presença capaz de fazer qualquer um tremer de medo, personagem que ainda ganha mais impacto com as escolhas da direção de fotografia ao contemplá-lo. Adulta, Laurie é amiga de Annie (Daniele Harris) e Lynda (Krista Klebe), jovens que diferente da final girl, cairão literalmente na lâmina da faca de Michael Myers em plena noite de Halloween.
Assim, com diálogos vulgares, personagens desbocados e animalizados como figuras de um romance naturalista, Halloween: O Início se desenvolve demonstrando para o espectador o quão perigoso Michael era desde criança, época em que torturava gatos e ratinhos para seu prazer e observação. O Dr. Samuel Loomis, agora interpretado por Malcolm McDowell, estabelece uma boa relação em cena com o antagonista, sendo estes alguns dos melhores momentos da narrativa. Danny Trejo tem uma participação como o enfermeiro que ajudou Myers durante a sua estadia no sanatório, mas que não é poupado quando o personagem consegue escapar e distribuir a sua ira pela cidade na fatídica noite de 31 de outubro. Ah, durante a sua fuga, o interesse maior é matar a irmã, agora chamada de Laurie e parte de outro núcleo familiar. No caminho, por sua vez, ele não poupa outras vítimas, mortas sem piedade por um assassino sanguinolento e com ampla força física. Destaque para Brad Dourif como o Xerife Lee Brackett e Sheri Moon Zombie como Deborah Myers, a mãe de Michael.