Bahia Pra Você

Evasão Escolar: o papel e a dimensão da Busca Ativa “pós-pandemia”

Manoel Calazans

A sociedade brasileira conseguiu, com muito atraso e diversas “aspas”, universalizar o Ensino Fundamental, não por desejo exclusivo das forças governamentais, mas principalmente por esforço e muita luta dos movimentos sociais e progressistas que, nas décadas de 1970 e 1980 travaram intensos debates e manifestações em prol de uma escola pública, gratuita e para todos os brasileiros e brasileiras. Ainda na década de 1980, especificamente em 5 de outubro de 1988, a Constituição Federal cravou o Direito à Educação Básica como matriz constitucional, entretanto, apenas a imposição legal não garante que as crianças sejam matriculadas, permaneçam nas escolas e construam de verdade as aprendizagens necessárias à inserção social em suas mais diversas dimensões.

Desafios educacionais ainda não se fixaram no passado da educação brasileira.  Tragicamente continuam como marcas do presente. Ainda dispomos de muitos adultos analfabetos totais ou funcionais, jovens em idade escolar que abandonam os seus estudos e são inseridos precocemente no mercado de trabalho informal, outros cooptados por organizações criminosas, creche para crianças de zero a três anos como artigo de luxo para as famílias mais pobres e uma percepção cruel e amarga de engolir, que é o fato de crianças, jovens e adultos terem acesso a matrícula, passarem pela escola, mas a escola parecer não ter passado por elas. Traduzindo: têm certificação escolar/diploma, mas não construíram as competências e habilidades essenciais. Alguns estudiosos da educação chamam tudo isso de improdutividade do sistema escolar brasileiro, inevitável não lembrar do Livro “A Produtividade Da Escola Improdutiva”, de Gaudêncio Frigotto, que continua atual, depois de mais de três décadas de seu lançamento.

Sim, meu rapaz, a ideia não era discorrer sobre evasão escolar pós-pandemia? Então, vamos aos fatos: se não voamos em céu de brigadeiro no campo educacional com a pandemia, poderemos piorar e, sobrevoar nos próximos anos céus nebulosos e turbulentos.

A Evasão Escolar é cruel e envolta quase sempre em diversas mazelas sociais. Fome, desemprego, abuso sexual, falta de políticas sociais de transferência de renda, violência, criminalidade, ausência de condições reais para o trabalho dos profissionais da educação, falta de controle social da Educação Pública e tantas outras questões que demandariam várias laudas para tratar de todas.

Não! Infelizmente não demos conta de resolver tudo isso. O Projeto de destruir a Educação Pública como forma de opressão e dominação ainda é mais esmagador e potente. A forma como educamos os ricos e educamos os pobres tem um distanciamento social ainda medido em ano/luz. Não gosto de generalizações, evito sempre que possível. Desta vez não deu. Se anteriormente falei do céu de brigadeiro, agora vou falar do mar agitado que vivemos com a COVID 19. Cada família e estudante tem se segurado no que encontra pela frente, são troncos, pedaços de isopor, boias improvisadas com as câmeras de pneus (…) alguns até flutuam (sobrevivem!), e muitos, muitos mesmo, têm afundado, ou literalmente sucumbido no que diz respeito à educação, passando a ser estatística educacional – evadidos e desistentes.

A expressão Busca Ativa, que já era conhecida nos meios educacionais como instrumento para reverter a desistência escolar, “tá se usando muito” nas lives, artigos e debates educacionais durante o processo de fechamento das escolas desde o primeiro trimestre de 2020.

Busca ativa “só da boca pra fora” com eloquentes discursos de “nenhum aluno a menos!”, não levará a lugar algum se for só retórica ou mensagem pelo WhatsApp para que o estudante continue vinculado à escola e desenvolvendo suas atividades remotas e/ou híbridas. Sem ação e Política Pública efetiva de permanência dos estudantes nas escolas, pouco ou nada será feito pelos mais vulneráveis.

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Sendo justo e sem a preocupação de que meu artigo seja taxado como chapa branca, afirmo que o Estado da Bahia, durante a Pandemia, foi o único a transpor o discurso da Busca Ativa, efetivando uma política governamental intitulada Bahia Solidária que no campo da educação mostrou ao país que as famílias em meio a tanta dificuldade financeira e social necessitam de suporte e auxílio para que as crianças e jovens permaneçam vinculados à Escola.

O Bolsa Presença, como eixo do Bahia Solidária, é um aporte financeiro para as famílias cadastradas no CadÚnico/Bolsa Família e com filhos matriculados na Rede Pública Estadual, no valor de cento e cinquenta reais, tendo como contrapartida familiar o compromisso com a assiduidade, participação e envolvimento nas atividades remotas.

Educar é um ato político, pressupõe escolhas, tomada de partido, ações e reflexões. Que mais políticas de garantia da frequência escolar sejam implementadas no Brasil, concretizando assim, a máxima de que, para continuar na escola é necessário, pelo menos, que as condições mínimas de permanência existam de verdade – Busca Ativa de fato e direito.

Reproduzir o discurso míope e preconceituoso de que evasão escolar é coisa de aluno pobre e que não gosta de estudar, eu deixo para quem adotou como slogan de vida um trecho da música de uma apresentadora de TV que diz “sonho sempre vem pra quem sonhar”.

Quase sempre, só sonhar não resolve.

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E já que a Bahia é Trabalho, que venha mais, com força e com todos.

Manoel Calazans é Mestre em Políticas Sociais e Cidadania,
Pedagogo, Especialista em Gestão escolar, atualmente
superintendente de Planejamento da Rede Pública estadual da Bahia.
Canal no Youtube: Manoel Calazans
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